Áreas de proteção ambiental - importantes, mas problemáticas
Áreas de proteção ambiental exercem um papel local e internacional muito importante na conservação das espécies e do clima. Em função disso, a ONU e muitos governos lutam, de comum acordo, para colocar sob proteção, até 2030, 30% da superfície da Terra. Embora “parque nacional” e “patrimônio da humanidade” soem bem, eles não são remédios universais e trazem riscos em seu bojo.
O problema
Declarar regiões como áreas de proteção ambiental ou expandi-las costuma soar bem junto à opinião pública. “Proteção” soa positivo. Durante a Conferência Mundial da Natureza da ONU em dezembro de 2022, esses 30% foram comemorados como um grande marco. No entanto, é grande o risco de que governos e organizações influentes desatendam justamente àqueles que, por meio de seu modo de vida, conservaram as florestas tropicais e outros tesouros da natureza: a população tradicional, frequentemente indígena.
Planos como “30% até 30” fazem soar os sinos de alerta de protetores de direitos humanos: Até 300 milhões de pessoas poderiam perder suas terras, se, subitamente, certas áreas devam ser “protegidas” de seus habitantes, que até então, viveram em harmonia com o meio-ambiente.
Com isso, a proteção da biodiversidade se transvestiria em na maior armadilha de roubo de terras e deslocamento da história da humanidade.
A origem do conceito de que a natureza deva ser protegida em áreas delimitadas provém dos EUA. O Parque Nacional de Yellowstone foi criado em 1872, sendo tido como o primeiro de sua categoria. Da América do Norte também provém a equivocada idéia de “selva” ou “mato”, isto é, que em muitas regiões existe muita “natureza intocada” onde vivem muitos animais, mas gente alguma. Especialmente na África. Segundo essa idéia, a natureza poderia ser especialmente preservada, quando a natureza e as pessoas estiverem separadas umas das outras. Quem critica esse conceito costuma caracterizá-lo como “fortress conservation” - ou seja, uma proteção à natureza que funciona como um “forte”.
Áreas de proteção ambiental (APAs) acabaram se tornando um instrumento global.. Em julho de 2022 havia 253.368 APAS em áreas terrestres 17.783 em áreas marítimas. Com o plano da ONU “30% até 30”, o tamanho dessas áreas protegidas praticamente dobraria.
Contudo, não basta simplesmente declarar no papel certas áreas como protegidas. Sua proteção precisa também ser assegurada localmente, e as proibições precisam ser implementadas. Isto pode levar a conflitos violentos, em especial quando guardas florestais armados são responsáveis pela fiscalização.
Quando se cria muitas APAs, o modo de vida da população indígena é criminalizado se, por causa delas, a prática tradicional da caça for punida como caça ilegal. Poda-se, assim, o direito dos povos tradicionais à alimentação, água, saúde, um padrão de vida agradável, tradições culturais e acesso a lugares espirituais. Povos seminômades são obrigados a tornar-se sedentários. Pessoas autônomas e independentes são transformadas em diaristas, mendicantes ou peça fotogênica para o agrado de turistas.
Pergunta-se: as APAs, ao menos, realizam a finalidade para a qual foram criadas? Pelo menos, em parte, isso é duvidoso. Apesar da existência de um número imenso de áreas protegidas, a crise climática e da biodiversidade se agravou. Assim é que no ano de 2010 os estados da ONU haviam estabelecido o objetivo de deter a extinção de espécies por meio da criação de mais áreas de proteção ambiental. No entanto, nenhuma dessas 20 Metas de Aichi foram alcançadas. Isso ocorreu, similarmente, com os Sustainable Development Goals (SDGs) visando o desenvolvimento sustentável.
Áreas de proteção ambiental, portanto, não são nenhum remédio universal, desprovido de qualquer problema para a biodiversidade e para o clima. Além disso, em hipótese alguma pode-se admitir que o preço da proteção à natureza seja a violação aos direitos humanos e deslocamento forçado de pessoas. Tendo em vista o agravamento das crises, não podemos dar-nos ao luxo de continuar apostando, na boa-fé, em conceitos que frequentemente funcionam mal.
A solução
Estudos e a experiência de ambientalistas confirmam que a natureza está sempre em melhor estado sempre que povos originários das florestas e outras comunidades locais possuem direitos sobre os territórios e assumem a responsabilidade por eles. Tanto é que, do ponto de vista global, a perda de florestas em áreas indígenas é claramente menor do que em áreas de proteção ambiental estatais, como parques nacionais.
Os indígenas, portanto, são os melhores guardiões da floresta. Seus direitos, portanto, precisam ser fortalecidos, também a serviço da proteção do clima e da biodiversidade.
É preciso que os direitos à terra das comunidades indígenas e tradicionais sejam reconhecidos e assegurados em medida bem mais forte. A base para isto, frequentemente, é o mapeamento dos territórios indígenas, atividade essa na qual os nativos tem de participar ativamente.
É preciso que a pobreza seja combatida, que sejam criados meios alternativos de renda e que a formação das pessoas seja aperfeiçoada - e isso por vários motivos. A proteção da natureza é um desses motivos.
Turismo não-agressivo pode exercer um papel importante nessa atividade, mas o turismo não pode jamais causar o deslocamento forçado de pessoas.
Áreas de proteção, sim, mas condicionadas a certos fatores
Áreas de proteção tem a sua legitimidade e podem dar uma importante contribuição para a proteção da biodiversidade e do clima.
Novas áreas de proteção ambiental somente podem ser criadas com a participação da população tradicional. Central, nesse aspecto é o chamado “consentimento livre, prévio e informado” (free prior informed consent, FPIC). Não é suficiente a realização de eventos informativos.
Áreas de proteção ambiental existentes somente podem ser ampliadas com o consentimento da população tradicional.
Assim, também no que se refere às APAs já existentes, é preciso fortalecer os direitos da população local. Caso esses direitos tenham sido desatendidos quando de sua criação, ou posteriormente, eles precisam ser restaurados. Dentre as medidas de restauração de direitos, pode-se incluir, por exemplo, a reintrodução dos povos indígenas nessas florestas, permitindo-lhes que eles lá exerçam a caça e extraiam produtos da floresta. Além disso, quem foi prejudicado precisa ser, conforme o caso, indenizado.
Cooperação internacional
Por ocasião da realização de convenções e conferências é preciso que seja, finalmente, concedido aos indígenas um direito de participação efetivo. É verdade que a ONU, governos e organizações internacionais fazem uso de palavras-chaves corretas como “direitos indígenas” e “respeito”, mas frequentemente os indígenas são admitidos meramente como “observadores” ou “conselheiros”.
O financiamento de grupos e instituições indígenas precisa ser garantido, por exemplo, por meio de dinheiro tirado de fundos do clima, conforme anunciado por Estados por ocasião da realização de conferências da ONU.
Focalizar as causas das crises
A proteção à biodiversidade e ao clima somente vai funcionar se for superado o nosso modo de viver e de fazer a economia girar, cuja base é o consumo transfronteiriço de matérias primas, produtos agrícolas e energia.
A sua assinatura pode ajudar a proteger as florestas tropicais! As nossas petições on-line viram-se contra projetos desastrosos e chamam os responsáveis pelos nomes. Juntos somos mais fortes!
A gente e a natureza do Congo estão precisando de paz
Faz 30 anos que as pessoas no leste da República Democrática do Congo vivem sob violência. Atualmente, o conflito está alarmante. Rebeldes estão cercando a cidade de Goma, e o Parque Nacional do Virunga está afetado. Nossa parceira, a RIAO-RDC está organizando manifestações de paz. Eles contam com a sua solidariedade.
Mais informaçõesPara: Presidente da República Democrática do Congo, Representantes da ONU e da UE
“O leste do Congo está precisando de segurança e paz. Senão, a garantia dos direitos humanos e a proteção da natureza vão permanecer ilusórias.”