Resistência popular à indústria da soja
21 de dez. de 2024
A agroindústria, com suas monoculturas, está avançando cada vez mais dentro da região amazônica. Por ocasião de uma visita a Berlim, nossos parceiros brasileiros fizeram relatos sobre sua resistência contra o roubo de terras, ataques com venenos e violência.
“A indústria da soja está fazendo uma guerra química contra as pessoas, para, com isso, fazer com que elas deixem suas terras. Trata-se do uso de pesticidas com o propósito específico de atingir as comunidades tradicionais, ameaçando-lhes a sobrevivência”, declarou Diogo Cabral - advogado brasileiro especialista em direitos humanos -em setembro, em Berlim. Como advogado, ele presta apoio, no Maranhão e no Pará, a diversas organizações parceiras de “Salve a Floresta”, dentre elas os povos indígenas Ka’apor e Awa, bem como as organizações Comisão Pastoral da Terra (CPT) e Xingu Vivo.
Para a visita de Cabral, que veio para a Alemanha com um grupo de 5 pessoas, “Salve a Floresta” organizou diversas reuniões em Berlim. No âmbito de uma conversa com funcionárias e funcionários do partido “Aliança 90/Os Verdes”, no Parlamento Federal alemão, eles relataram como aviões e drones pulverizam não apenas monoculturas de soja com um “coquetel” de venenos, mas também suas aldeias, lavouras agrícolas, florestas e rios.
“Com isso, estão liquidando nossas colheitas e a natureza, matando peixes e fazendo as pessoas ficarem doentes. Estamos reivindicando que a pulverização aérea de agrotóxicos seja proibida. Sete municípios no Maranhão já a proibiram”, diz Cabral.
“Nos últimos 5 anos, somente no Maranhão foram assassinados 50 defensores de direitos humanos “, declara Edimilson Costa, da Federação dos Trabalhadores Rurais do Maranhão (FETAEMA). Milícias recrutadas e pagas por fazendeiros estão ameaçando as pessoas - frequentemente até em conjunto com policiais locais. “44 das vítimas eram indígenas ou afro-brasileiros.” Quase nenhum dos homicídios foi esclarecido até agora, isso é racismo estatal.”
O grupo pede que o governo alemão converse com o governo brasileiro sobre sua política de proteção de direitos humanos e reclame por medidas efetivas para sua proteção.
As monoculturas estão se expandindo cada vez mais
As monoculturas brasileiras de soja, no Brasil, ocupam uma área de 45 milhões de hectares. Isso corresponde à soma da área da Alemanha e da Áustria. O Brasil produz anualmente 160 milhões de toneladas de soja, sendo com isso, o maior produtor de soja do mundo. Também a produção de milho parece não conhecer limites. Em 2023 foram colhidas 126 milhões de toneladas de milho em uma área de 22 milhões de hectares.
A maior parte da colheita de soja e milho é exportada para a China e para a Europa, onde vai parar em tigelas para suínos, bovinos e frangos. A partir do óleo de soja, também se produz biodiesel; do milho, produz-se combustível de etanol para caminhões e carros.
O Estado segue procrastinando o reconhecimento dos direitos territoriais
A agroindústria e os latifundiários seguem se apropriando de terra alheia em grande estilo, não se pejando, para isso, em fazer uso de documentos falsos ou de violência. As comunidades tradicionais, frequentemente, não possuem títulos registrais de propriedade, porquanto os processos de reconhecimento de seus direitos, não raro, são impedidos ou simplesmente são procrastinados até mais não poder. Nisso, está incluído também o acervo de palmeiras-babaçu no Maranhão. Nesse estado, 400 mil mulheres colhem o babaçu, confeccionando, a partir dele, um sem-número de produtos, como por exemplo, o cobiçado óleo de babaçu. No entanto, cada vez mais os palmeirais vêm sendo derrubados, queimados e cercados para dar lugar a pastos bovinos e monoculturas de soja.
“Precisamos de uma reforma agrária para uma distribuição justa de terras, dinheiros para escolas e instituições de saúde, porquanto em muitas aldeias falta de tudo, de modo que a subnutrição ou até a fome acabam por imperar”, diz Ariana Gomes da Rede de Agroecologia do Maranhão (RAMA).
Pesticidas e Engenharia Genética
“Existe uma aliança entre a agroindústria e o Estado. Para o Governo e o Parlamento, a agroindústria tem mais valor do que as pessoas”, critica Adriana Oliveira, da Federação dos Trabalhadores Rurais do Maranhão, em Açaílândia, no âmbito de uma reunião de rede no Instituto Latinoamericano da Universidade Livre de Berlim. O objetivo da reunião é estreitar a parceria com organizações alemã contra a química agrária.
No Brasil, não tem como ignorar o poderoso lobby agrário, que, com a chamada “bancada ruralista”, domina 2/3 das cadeiras do Congresso Nacional brasileiro. Em maio, eles até conseguiram derrubar um veto do Presidente Lula contra partes do chamado “Pacote do Veneno”. A lei aprovada libera a autorização de substâncias químicas proibidas (comumente usadas em agrotóxicos) quase que por completo, as quais incluem muitas substâncias que, na Europa, são proibidas.
Para conglomerados industriais químicos alemães, como Bayer e BASF, o Brasil é um dos seus mais importantes mercados. A indústria alemã produz não apenas herbicidas e inseticidas, mas também a semente “certa”. Quase todas as espécies de soja e milho foram geneticamente modificadas na América do Sul, tendo se tornado resistentes contra herbicidas tais como o Roundup. É assim que as monoculturas gigantes são pulverizadas a partir de aviões e drones com enormes quantidades de venenos, os quais matam todas as outras plantas, e além disso, são danosos para seres humanos e animais.
O grupo fez uma dura crítica a um tal “Programa para Cadeias de Fornecimento de Soja Sustentável no Maranhão”, promovido pela Cooperação Alemã para o Desenvolvimento Sustentável (GIZ). “Soja sustentável é uma lenda, pois monoculturas jamais serão sustentáveis. Com o seu apoio, o que o GIZ faz é apoiar as estratégias de greenwashing da indústria da soja”, declara o advogado Cabral. Em vez disso, o que o GIZ deveria fazer era reivindicar o cumprimento dos direitos humanos e a efetivação dos direitos à terra.
Sucesso contra roubo de terras
Em Timbiras, no Maranhão, 200 famílias de pequenos agricultores processaram a empresa agrária Maratá, em virtude de roubo de terras. A CPT, que é nossa parceira, deu-lhes suporte jurídico e ministrou cursos a eles. Em abril deste ano, eles conseguiram obter, no tribunal, a ordem de devolução de 1700 hectares de terra, dos quais a firma os expulsara, mediante uso de violência. As doações de “Salve a Floresta” foram decisivas para que as pessoas tenham podido defender os seus direitos. Nesse meio-tempo, eles já reconstruíram suas casas, estão trabalhando nas lavouras e plantando árvores.
Nos estados do Maranhão e do Pará, a nossa associação dá suporte para um total de dez organizações e povos indígenas, visando a proteção dos direitos humanos e do direito às terras, a conservação da floresta tropical, bem como para apoiar a resistência contra um planejado projeto ferroportuário para facilitar a exportação de soja e de minério-de-ferro.
Entre em ação
Assine nossa Petição contra a pulverização aérea de agrotóxicos.
Vale a pena ver
“Lutamos pela terra“: Um documentário sobre as consequências da intensa expansão das monoculturas de soja (em Português, com legendas em inglês).